Liliana Peixinho *
Minha canequinha do Vitória
Enfrenta
fila, espera um tempão no ponto pra pega buzú lotado, investe parte do suor
sagrado para reafirmar a identidade de torcedor, na compra de camisa, ingresso, meia, boné,
churrasquinho de gato, cerveja, refrigerante, água, numa partida. Leva horas
falando sobre um gol ou perda dele, com o amigo, o colega de trabalho, o
desconhecido, manifestando emoções em correntes solidárias na dor ou alegria.
O torcedor é uma entidade intrigante,
como a alma humana. Olha pro close no rosto da moça bonita, do moço grisalho,
da criança inocente, do jovem cheio de energia, flagrados em lentes abertas, nas
arquibancadas, e observe a atenção, o olhar fixo no movimento em campo, e tente
acompanhar as reações, depois de cada finalização. Muda tão rápido, entre a
concentração e a explosão, como o próprio movimento em campo, sentido por
canais abertos a adrenalinas. Não tem como não acreditar no choro da moça bonita
da arquibancada; na declaração madura do perdedor disposto a começar tudo de
novo. Na repetição, inocentemente convicta, do nome do time, pela criança, referenciada no pai, mãe, vô, tio, primo,
amigo, vizinho, colega de escola, do trabalho.
Lembra, ou
já esqueceu, do pênalti perdido pelo Neymar Filho, na famoso jogo número 1000
da Seleção brasileira, realizado recentemente nuns Estados Unidos pós fortes
tempestades e campos engramados de última hora? O torcedor perduô? Oôôôô, o
Brasil empatou! Esse grito não se ouve. Mas entre perder e empatar, num jogo
massivamente marqueteado mundo afora como histórico, no futebol brasileiro,
argumentos diversos alimentam a cultura dos 190 milhões de técnicos
brasileiros. 190 milhões? Sim, entre padres, pastores, rabinos, mães e pais de
santo, psicólogos e ateus. E não adianta fingir que não foi contaminado porque
é feio mentir pra corações blindados à Razão!
Comportamentos agressivos, de
xingamentos, de objetivos muito imediatos, sem visão ampliadas das diversas
emoções incorporados no torcedor, não consigo entender. Acho até compreensível
que no campo da disputa, da rivalidade, pode-se conviver com o humor
inteligente de brincadeiras sobre perdas de pontos, posições no quadro geral de
classificação. Veja essa postada pelo professor e jornalista Wilson Bueno, torcedor
fiel do Palmeiras. ”Malandro mesmo é o Palmeiras que nem esperou o domingo
acabar e já passou pra segunda”.
De onde vem
essa emoção? Quais as suas alianças, origens? Por que é tão gratuitamente
intensa, verdadeira, apaixonada? De onde vem tanto acreditar? O time perde,
perde, perde, seguidamente, e cada novo jogo do calendário, extenso e contínuo,
vem como uma esperança de mudança, onde regras não definem resultados diante da
imprevisível combinação de movimentos natural ou estrategicamente construídos durante
o tempo regulamentado, mas soberano em resultados, inesperados. Lembro da fé
nordestina, diante de seca, sedenta dágua, esperando, lua à lua, sol à sol, que
a chuva caia. E quando vem forte, com enxurradas, trovoadas e relâmpagos,
energizam resistências para o cultivo da Vida.
Liliana Peixinho * Torcedora do Vitória (BA), Fluminense (RJ) e Central (Caruaru -PE)
Nenhum comentário:
Postar um comentário